Os
pregadores raramente têm dificuldade em pregar assuntos do Antigo Testamento.
Mas pregar a Cristo com base no Antigo Testamento pode ser uma questão
diferente. Entretanto, foi exatamente isso que Paulo fez, quando chegou em
Tessalônica, conforme nos mostram com clareza estes versículos de Atos dos
Apóstolos. De fato, o Antigo Testamento contém muitas passagens que são
explicitamente “messiânicas”. Ou seja, tais passagens fazem uma referência
inconfundível à vinda de Cristo. Isaías 53 é, talvez, o exemplo mais famoso.
Contudo, há muitos outros exemplos. Ninguém achará problemas ao pregar sobre
estas Escrituras do Antigo Testamento.
A dificuldade está em alcançar uma
interpretação cristológica geral e coerente do Antigo Testamento — uma interpretação
em que todas as Escrituras do Antigo Testamento são vistas como um testemunho
de Cristo e são interpretadas de conformidade com isso.
Primeiro e
fundamentalmente, é mesmo necessário acharmos tal interpretação? Em segundo, se
devemos encontrá-la, como podemos achar Cristo em todas as Escrituras?
ICEBERGS OU ILHAS?
Uma
analogia pode nos ajudar a tratar da primeira dessas perguntas. Considere um
iceberg flutuando no oceano. É algo belíssimo, mas flutua livremente no oceano,
não estando enraizado no seu ambiente cercado de água. O iceberg é incidental,
está isolado e não tem importância duradoura. Por contraste, uma ilha é uma
manifestação visível da geografia oculta do oceano — talvez denunciando a
existência de um vulcão extinto. Ela é uma parte integral do assoalho do
oceano, embora a maior parte desse assoalho esteja coberta, a menos que
exploremos as profundeza dos mares. De modo semelhante, as passagens
messiânicas podem ser “icebergs, lindas em si mesmas, mas incidentais, não
estando vinculadas às Escrituras do Antigo Testamento — estranhezas desconexas
que não refletem, de modo algum, a natureza intrínseca daquelas Escrituras. Por
outro lado, essas passagens podem ser “ilhas” — afloramentos visíveis de uma
realidade profunda que dá sustentação às Escrituras do Antigo Testamento, de
Gênesis a Malaquias. Creio que essa é a visão do Antigo Testamento revelada
pelo Novo. Sem dúvida, a realidade oculta é Cristo. Consideremos as evidências
que existem para apoiar este argumento.
A EVIDÊNCIA
Em primeiro
lugar, as cartas do Novo Testamento contêm diversas declarações afirmando que o
propósito das Escrituras do Antigo Testamento é instruir e edificar os crentes
da Nova Aliança. Além disso, em cada caso, a afirmação tem uma influência no
testemunho do Antigo Testamento sobre a pessoa de Cristo. De fato, essas
declarações dizem: “O Antigo Testamento foi escrito tendo em vista o nosso
benefício; e esse benefício está em Cristo”. Um exemplo é Romanos 15.1-4. Esta
passagem começa com uma exortação moral simples: “Ora, nós que somos fortes
devemos suportar as debilidades dos fracos e não agradar- nos a nós mesmos”.
Mas Paulo não pára aqui. Esse comportamento, insiste Paulo, resulta do exemplo
de Cristo: “Porque também Cristo não se agradou a si mesmo; antes, como está
escrito [Salmos 69.9]: As injúrias dos que te ultrajavam caíram sobre mim”.
Paulo continua: “Pois tudo quanto, outrora, foi escrito para o nosso ensino foi
escrito, a fim de que, pela paciência e pela consolação das Escrituras,
tenhamos esperança”. A palavra grega traduzida por “tudo quanto” é enfática.
Isto nos diz não somente que a citação obscura de Salmos 69.9 se refere a
Cristo, mas também que todas as Escrituras do Antigo Testamento foram
registradas especificamente para o nosso benefício. Este benefício, diz Paulo,
nos alcança na forma de ensino, paciência, consolação e, acima de tudo,
esperança em Cristo (não existe qualquer outra esperança).
PONDO O SENHOR À PROVA
Uma segunda
afirmação encontramos em 1 Coríntios 10.9-12, onde Paulo adverte: “Não ponhamos
o Senhor à prova, como alguns deles já fizeram e pereceram pelas mordeduras das
serpentes... Estas coisas lhes sobrevieram como exemplos e foram escritas para
a d v e r t ê n c i a nossa, de nós outros sobre quem os fins dos séculos têm
chegado”. Assim como em Romanos 15, Paulo faz duas declarações e as une.
Primeira, o propósito do Antigo Testamento — mesmo em suas partes históricas —
é instruir e admoestar aqueles que vivem sob a nova aliança (“sobre quem os
fins dos séculos têm chegado”). Mas acrescentou: é a Cristo que não devemos por
à prova. Isto significa que estas Escrituras nos admoestam não em assuntos
gerais, mas em referência ao nosso relacionamento com Cristo. O próprio Senhor
Jesus comparou “a serpente no deserto” à sua crucificação, em João 3.14. Uma
terceira afirmação pode ser encontrada em 1 Coríntios 9.9-10: “Porque na lei de
Moisés está escrito: Não atarás a boca ao boi, quando pisa o trigo. Acaso, é
com bois que Deus se preocupa? Ou é, seguramente, por nós que ele o diz? Certo
que é por nós que está escrito; pois o que lavra cumpre fazê-lo com
esperança...”
NÃO PARA SI MESMOS
Pedro
concorda (1 Pedro 1.8- 12). Ele escreveu: “Foi a respeito desta salvação [por
meio de Cristo] que os profetas indagaram e inquiriram, os quais profetizaram
acerca da graça a vós outros destinada... pelo Espírito de Cristo, que neles
estava, ao dar de antemão testemunho sobre os sofrimentos referentes a Cristo e
sobre as glórias que os seguiriam”. “A eles foi revelado que, não para si mesmos,
mas para vós outros, ministravam as coisas que, agora, vos foram anunciadas por
aqueles que, pelo Espírito Santo enviado do céu, vos pregaram o evangelho”.
Isso dificilmente poderia ser mais claro. Os profetas do Antigo Testamento (uma
expressão que inclui todos os outros escritores do Antigo Testamento) foram
movidos pelo Espírito Santo, para testemunhar sobre os sofrimentos e a glória
de Cristo. E, ao fazerem isso, não estavam ministrando primeiramente à sua
própria geração, e sim àqueles que ouviriam o evangelho do Novo Testamento, o
evangelho da salvação por meio da graça.
O ANTIGO TESTAMENTO DÁ TESTEMUNHO DE CRISTO
Chegamos
agora a várias afirmações definidas concernentes ao testemunho do Antigo
Testamento sobre a pessoa de Cristo. A primeira se encontra em João 5.39, onde
Jesus falou ao judeus: “Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a
vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim”. Esta não é uma afirmação
desconexa; antes, é parte de um argumento mais amplo. Pois Jesus continuou:
“Se, de fato, crêsseis em Moisés, também creríeis em mim; porquanto ele
escreveu a meu respeito. Se, porém, não credes nos seus escritos, como crereis
nas minhas palavras?” (Jo 5.46-47). Observe a escolha das palavras. Cristo não
disse apenas: “As Escrituras... testificam de mim”; isso implicaria que os
escritores do Antigo Testamento fizeram essas declarações ocasionalmente. Pelo
contrário, Jesus disse: “São elas mesmas que testificam de mim”, implicando que
o propósito do Antigo Testamento é testificar a respeito dEle. Além disso,
Jesus declarou de modo indubitável que os escritos de Moisés (ou seja, todo o
Pentateuco) dão testemunho de Cristo, e não fazem apenas referências ocasionais
a Ele. Isto é significativo porque, em nossos dias, existe uma tendência geral
de se pregar sobre assuntos como a criação, os patriarcas e a lei de Moisés, de
um modo que ignora a Cristo. Mas, de acordo com Jesus, Moisés escreveu a
respeito dEle em todos os primeiros cinco livros da Bíblia.
EM TODA A ESCRITURA
Uma segunda
passagem importante é Lucas 24.25-27, o episódio familiar da Estrada de Emaús.
O Cristo ressuscitado repreende os seus discípulos abalados: “Ó néscios e
tardos de coração para crer tudo o que os profetas disseram!... E, começando
por Moisés, discorrendo por todos os Profetas, expunha-lhes o que a seu
respeito constava em todas as Escrituras”. Observe o uso tríplice da palavra
“todo”. Lucas estava interessado em que entendêssemos a natureza abrangente das
afirmações de Jesus — ou seja, que todo o Antigo Testamento, e não apenas uma
parte dele, é uma profecia a respeito de Cristo. “Moisés” e “os Profetas” eram
expressões que significavam todo o Antigo Testamento. E Jesus nos disse, em
outra passagem, que viera para cumprir todo “i” e todo “til” das Escrituras (Mt
5.17-18). Se Cristo é o cumprimento das Escrituras, elas têm de apontar,
necessariamente, para Ele.
SÁBIO PARA A SALVAÇÃO
Nosso
último texto comprobatório é 2 Timóteo 3.15-17: “Desde a infância, sabes as
sagradas letras, que podem tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo
Jesus”.
“Toda a
Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a
correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja
perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra.” Freqüentemente,
citamos estas palavras, quando falamos sobre a natureza e a utilidade da
Escritura, afirmando que ela é “inspirada” (literalmente, soprada por Deus) e
instrutiva. Mas esquecemos com facilidade a declaração que levou Paulo a
descrever deste modo o Antigo Testamento. Qual é essa declaração? Que as
Escrituras do Antigo Testamento nos iluminam quanto à salvação pela fé em
Cristo! Uma vez mais Paulo se refere de modo abrangente às Escrituras do Antigo
Testamento, como aquelas que revelam a Cristo em seu poder salvador. É neste
contexto cronológico que o apóstolo recomenda, posteriormente, o Antigo
Testamento como um livro que é fonte de instrução e de orientação sobre boas
obras.
CONCLUSÃO
Assim, as
Escrituras me compelem a crer que o Antigo Testamento, em sua totalidade,
testemunha sobre a pessoa de Cristo e foi escrito especificamente para o
benefício dos crentes do Novo Testamento — e de todo aquele que deseja ser
“sábio para a salvação” nEle. As passagens messiânicas, no Antigo Testamento,
são ilhas, e não icebergs, que revelam a cristologia abrangente
e essencial do Antigo Testamento.
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| Editora Fiel | Original aqui
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