É
lógico que o problema está no fato de que não se pode servir a dois senhores.
Como o Senhor já disse: "ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há
de aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a um e desprezará ao
outro".
Tempos
Estranhos e uma Teologia Incerta
Vivemos em tempos
estranhos. Raramente um ano se passa sem haja alguma conferência, em algum
lugar, sobre o futuro da igreja; com pelo menos um pregador ou, às vezes, até
mesmo uma lista de pregadores que, de modo controverso, representam exatamente
o tipo de teologia que tem esvaziado os bancos das igrejas, eliminado a
pregação e assassinado o compromisso com o evangelho.
Recentemente,
vi um panfleto de uma dessas conferências, no qual havia um elogio a um grande
pensador e crítico evangélico. Porém, o palestrante mais importante dessa
conferência representava exatamente o tipo de teologia enganosa à qual o
pensador elogiado havia devotado toda sua vida ridicularizando. Realmente, são
tempos estranhos.
O
que está acontecendo? Qual é o porquê dessa necessidade covardemente
desprezível de receber aceitação da maior parte do mundo?
Por que os Acadêmicos Evangélicos
Desejam a Aceitação do Mundo?
Suspeito
que haja muitas razões para esse problema. Primeiro, o contexto do
evangelicalismo se presta exatamente a esse tipo de confusão. De fato, o
evangelicalismo não compreende o que ele próprio é. Ele é um movimento baseado
na experiência (novo nascimento), nos compromissos teológicos ou em
instituições para-eclesiásticas? É aí que está a dificuldade: O primeiro fator
(experiência) se degenerará num mero misticismo subjetivo se não estiver
associado ao segundo (compromissos teológicos). O segundo fator tem sido bem
discutido entre os evangélicos, os quais nem mesmo concordam em relação à
resposta à pergunta de Pilatos: "O que é a verdade"? E o terceiro
(instituições para-eclesiásticas) muitas vezes faz parte do problema para
definir o segundo ou, no caso específico dos Estados Unidos, passa a ser menos
ministério e mais um meio para cultuar celebridades, vulnerável ao tipo de crítica
feito por Erick Hoffer; que afirmou que toda grande causa começa como um
movimento, torna-se um negócio e termina como uma oportunidade para extorsão. O
evangelicalismo é uma bagunça lamentável; não é puro, nem simples.
Em
segundo lugar, se um movimento não sabe o que ele mesmo é, então não pode fazer
qualquer exigência satisfatória em relação aos que pertencem a ele e aos que
não pertencem. Os limites de um movimento acabam se revelando por aquela pessoa
que mais se aproxima do fato de pertencer, mas que, no entanto, não pertence ao
movimento. Ário é um antigo exemplo disso na igreja. Por mais elevada e
exaltada que fosse sua visão de Cristo, ele ainda era capaz considerá-lo
simplesmente como uma criatura e não como completamente Deus. O limite estava traçado
e Ário estava fora dele. Combine os problemas de definição da identidade
evangélica com a atual inclinação cultural para não excluir quem quer que seja,
e você terá uma receita entorpecedora para um desastre total. Diga coisas
agradáveis sobre Jesus, tenha um sentimento cordial quando alguém acender uma
vela e seja bondoso com sua avó e – e instantaneamente! – você é um membro;
você pode ser um evangélico. Dessa forma, teremos aqueles que negam a
substituição penal; que não têm qualquer noção significativa da autoridade
bíblica, da exclusividade de Cristo na salvação, da justificação pela graça,
por meio da fé e da singularidade da salvação. Não importa: apenas enfatize que
Jesus era um cara legal e divertido; articule algumas frases que pareçam ortodoxas;
fale com um tom apaixonado e você também poderá ter seu certificado de
membrezia e fazer um discurso de apresentação. E se as conferências que
mencionei acima forem um indício de como as coisas estão, é sinal que temos
sido enganados por esses ardis o tempo todo.
Em
terceiro, seria como se houvesse um complexo de inferioridade evangélico
generalizado. Isso significa que ao mesmo tempo em que desejamos não excluir
quem quer que seja, tememos ser excluídos. Naturalmente, num mundo tão mal
definido, é sempre uma tentação para um acadêmico evangélico, fazer as coisas
do modo mais fácil ou permanecer calado acerca de alguns compromissos
doutrinários mais embaraçosos, a fim de obter um pouquinho mais de influência
naquele palco um pouquinho maior, do outro lado do mundo. Essa é uma tentação
específica dos eruditos e sistematistas evangélicos, cujas grandes associações
são completamente antipáticas ao tipo de sobrenaturalismo e reivindicações das
verdades antiquadas, sobre as quais os estatutos de suas igrejas foram
amplamente constituídos. Ao fazermos isso, enganamos a nós mesmos, dizendo que,
de algum modo, estamos fazendo a obra de Deus; pois se temos artigos publicados
neste periódico ou por aquela editora, estamos realmente fazendo progressos na
cultura incrédula das faculdades teológicas. Não que essas coisas não sejam
boas e dignas – eu mesmo faço esse tipo de coisa – mas precisamos ter o cuidado
para não confundir realizações acadêmicas profissionais com a edificação dos
santos ou com o fato de marcarmos pontos para o reino de Deus.
Conforme
James Barr destacou anos atrás, continua sendo verdade que os acadêmicos
evangélicos somente são respeitados no mundo acadêmico exatamente por aqueles
pontos nos quais eles são menos evangélicos. Existe uma diferença entre
respeitabilidade acadêmica ou erudita e integridade intelectual. Para um
cristão, esta depende da aprovação de Deus e está arraigada na fidelidade à sua
Palavra revelada. Isso nem sempre significa jogar conforme as regras das
associações acadêmicas.
O que os Nossos Acadêmicos Precisam é
de Ambição... Mas Não Daquele Tipo
Finalmente,
pouquíssimos acadêmicos evangélicos parecem ter muita ambição. Talvez isso soe
estranho: o desejo de manter o direito de posse de uma posição na universidade;
de publicar com certas editoras; de palestrar em certas conferências
acadêmicas; de trocar idéias com os chefões das associações – todas essas
ambições parecem muito comuns; entretanto, a verdadeira ambição, a verdadeira
ambição cristã, certamente se baseia na edificação da igreja e no serviço ao
povo de Deus, e se direciona para isso. Mas é exatamente nesse ponto que os
acadêmicos evangélicos falham de modo tão evidente. De forma geral, o impacto
que os eruditos evangélicos têm obtido no mundo acadêmico tem sido irrisório e,
muitas vezes (conforme mencionado) confinado àquelas áreas em que suas
contribuições têm sido insignificantemente evangélicas. Se o mesmo tempo e
energia fossem dedicados à edificação dos santos, imagine como a igreja poderia
estar transformada.
Isso
não significa dizer que não devemos permitir a erudição substancial, nem que as
necessidades de um homem ou de uma mulher do banco da igreja sirvam de critério
pelo qual a relevância deva ser julgada; mas é afirmar que toda a erudição
teológica deve ser realizada com o alvo primordial de edificar os santos,
confundir os oponentes do evangelho e encorajar os irmãos. A façanha mais
elevada que um teólogo evangélico erudito pode alcançar não é ser membro de
alguma associação elitista, mas sim obter o conhecimento de que ele tem
trabalhado para fortalecer a igreja e expandir o reino de Deus, por meio da
igreja local.
Está
chegando o dia em que as elites intelectuais e culturais do evangelicalismo –
instituições e indivíduos – terão de enfrentar uma árdua decisão. Vejo a crise
se aproximando em duas frentes de batalha diferentes, mas intimamente ligadas.
Primeira, está chegando a hora e, talvez já tenha chegado, em que crer que a
Bíblia é a Palavra inspirada de Deus, imposta por Ele e totalmente verdadeira,
será, na melhor das hipóteses, um suicídio intelectual e na pior delas, um
sinal de doença mental. Segunda, articular qualquer forma de oposição ao
homossexualismo será o mesmo que advogar em favor da supremacia da raça branca
ou do abuso de crianças. Nesses tempos, a escolha será clara. Aqueles que se
mantiverem nas fileiras cristãs serão óbvios, e aqueles que têm gastado suas
vidas tentando servir tanto aos ortodoxos quanto aos acadêmicos descobrirão que
nenhum contorcionismo intelectual poderá salvá-los. A preocupação com o fato de
serem associados a B. B. Warfield será a menor delas.
Anos atrás, Mark Noll escreveu um livro, The Scandal of the
Evangelical Mind ("O Escândalo da Mentalidade Evangélica"),
no qual ele argumentava que o escândalo residia no fato de não haver tal
mentalidade evangélica. No que diz respeito aos eruditos evangélicos e à sua
erudição, eu discordo, o escândalo não está no fato de não haver uma
mentalidade evangélica; mas no fato de existir, em nossos dias, um pequeno
evangelho muito valioso.Traduzido por: Waléria Coicev
Copyright:
© 9Marks 2010
© Editora FIEL 2010.
Traduzido do original em inglês: The Real Scandal of the Evangelical Mind - Publicado por 9Marks.
O leitor tem permissão para divulgar e distribuir esse texto, desde que não altere seu formato, conteúdo e / ou tradução e que informe os créditos tanto de autoria, como de tradução e copyright. Em caso de dúvidas, faça contato com a Editora Fiel.
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Traduzido do original em inglês: The Real Scandal of the Evangelical Mind - Publicado por 9Marks.
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