O conceito de piedade (pietas) ensinado por Calvino se fundamentava no
conhecimento de Deus, incluindo atitudes e ações direcionadas à adoração e ao
serviço de Deus. Além disso, a pietas de Calvino incluía uma
hoste de temas relacionados, tais como o amor nos relacionamentos humanos e o
respeito à imagem de Deus nos seres humanos. Essa piedade é evidente em pessoas
que reconhecem, por meio da fé experiencial, que foram aceitas em Cristo e
enxertadas no corpo dEle, pela graça de Deus. Nesta “união mística”, o Senhor
declara essas pessoas como pertencentes a Ele, tanto na vida como na morte.
Elas se tornam povo de Deus e membros de Cristo pelo poder do Espírito Santo.
Este relacionamento restaura-lhes o gozo da comunhão com Deus e recria-lhes uma
nova vida. Liberta-as da escravidão ao mundanismo carnal.
O propósito deste texto é mostrar que a piedade de Calvino é uma resposta
suficiente ao problema do mundanismo; seu conceito de piedade é algo que
conquista o nosso coração. A piedade de Calvino é bíblica, com uma ênfase no
coração mais do que na mente. A mente e o coração devem trabalhar juntos, mas o
coração é mais importante.
A definição e a importância da piedade
Pietas é um dos grandes temas da
teologia de Calvino. Como nos diz John T. McNeill, a teologia de Calvino é a
“sua piedade descrita em profundidade”. Ele estava determinado a confinar a
teologia aos limites da piedade. No prefácio dirigido ao rei Francisco I,
Calvino afirma que o propósito em escrever asInstitutas era
“transmitir unicamente certos rudimentos pelos quais aqueles que possuem zelo
pelo cristianismo podem ser moldados na verdadeira piedade [pietas]”.A definição e a importância da piedade
Para Calvino, pietas designa a atitude correta de um homem
para com Deus. É uma atitude que inclui conhecimento verdadeiro, adoração
sincera, fé salvadora, temor filial, submissão e amor reverentes. Saber quem e
como Deus é (teologia) envolve atitudes corretas para com Ele e fazer o que Ele
deseja (piedade). Em seu primeiro catecismo, Calvino escreveu: “A verdadeira
piedade consiste em um sentimento sincero que ama a Deus como Pai e O
reverencia como Senhor; apropria-se de sua justiça e teme mais o ofendê-Lo do
que o enfrentar a morte”. Nas Institutas, João Calvino é mais
sucinto: “Chamo de piedade aquela reverência unida ao amor a Deus, o amor que é
fruto do conhecimento de seus benefícios”. Esse amor e reverência para com Deus
é um acompanhamento indispensável a qualquer conhecimento de Deus e abrange
todos os aspectos da vida. Conforme afirmou Calvino: “Toda a vida dos crentes
deve ser um tipo de prática da piedade”. O subtítulo da primeira edição das Institutas
dizia: “Incluindo quase todo o resumo da piedade e qualquer coisa necessária
para se conhecer a doutrina da salvação: Uma obra muito digna de ser lida por
todos os zelosos por piedade”.Os comentários de Calvino também refletem a
importância de pietas. Por exemplo, ele escreveu sobre 1 Timóteo
4.7-8: “Você fará algo de grande valor se, com todo o seu zelo e habilidade, se
dedicar unicamente à piedade [pietas]. A piedade é o começo, o meio e o
fim do viver cristão. Onde ela é completa, não há falta de nada... A conclusão
é que devemos concentrar-nos, exclusivamente, na piedade, pois, uma vez que a
tenhamos atingido, Deus não exige de nós qualquer outra coisa”. Comentando 2
Pedro 1.3, Calvino disse: “Quando Pedro fez menção da vida, acrescentou imediatamente
a piedade [pietas], como se esta fosse a essência da vida”.
O alvo supremo da piedade: Soli Deo Gloria
O alvo da piedade,
bem como de toda a vida cristã, é a glória de Deus — a glória que resplandece
nos atributos de Deus, na estrutura do mundo, na morte e na ressurreição de
Jesus Cristo. No que diz respeito a todos os que são verdadeiramente piedosos,
o glorificar a Deus supera a salvação pessoal. Por isso, Calvino escreveu ao
cardeal Sadoleto: “Não é uma teologia bastante saudável confinar os pensamentos
de um homem a ele mesmo e não apresentar-lhe, como motivo fundamental de sua
existência, o zelo pela glória de Deus... Estou convencido: não existe nenhum
homem que possua a piedade verdadeira e não considere como insípida aquela
extensa e laboriosa exortação em favor do zelo pela vida celestial, um zelo que
o mantém totalmente dedicado a si mesmo e que não o desperta, nem mesmo por uma
única expressão, a santificar o nome de Deus”.O alvo da piedade — que Deus seja glorificado em nós — é aquilo para o que
fomos criados. Portanto, o nascido de novo anela por vivenciar o propósito de
sua criação original. De acordo com Calvino, o homem piedoso confessa: “Somos
de Deus; vivamos e morramos para Ele. Somos de Deus; sejamos governados por sua
sabedoria e vontade em todos os nossos atos. Somos de Deus; em harmonia com
isso, devemos segui-Lo como nosso único objetivo lícito, em todo os aspectos de
nossa vida”.Deus redime, adota, santifica o seu povo, para que sua glória resplandeça neles
e os liberte da busca pelo egoísmo ímpio. O profundo interesse do homem piedoso
é Deus mesmo e suas coisas — sua Palavra, sua autoridade, seu evangelho, sua
verdade. O homem piedoso tem intenso desejo de conhecer mais a Deus e de ter
mais comunhão com Ele como o seu único alvo.Mas, como glorificamos a Deus? Calvino escreveu: “Deus nos prescreveu uma
maneira pela qual Ele pode ser glorificado por nós, a saber, a piedade, que
consiste na obediência à sua Palavra. Aquele que ultrapassa esses limites não
está honrando a Deus; pelo contrário, está desonrando-O”. A obediência à
Palavra de Deus significa refugiar-se em Cristo para o perdão de nossos
pecados, conhecê-Lo por meio de sua Palavra, servi-Lo com um coração repleto de
amor, praticar boas obras em gratidão por sua bondade e exercitar
auto-renúncia, a ponto de amar os nossos inimigos. Esta resposta envolve
rendição total a Deus mesmo, à sua Palavra e à sua vontade.O alvo supremo da piedade: Soli Deo Gloria
Calvino disse: “Ofereço-Te meu coração, Senhor, imediata e sinceramente”. Esse
é o desejo de todos os que são verdadeiramente piedosos. Contudo, esse desejo
pode ser realizado apenas por meio da comunhão com Cristo e da participação
nEle; pois, fora de Cristo, até a pessoa mais religiosa vive para si mesma. E
apenas em Cristo os piedosos podem viver como servos voluntários, soldados
leais de seu Comandante e filhos obedientes de seu Pai.
Tradução: Wellington Ferreira
Revisão: Tiago Santos
Copyright: © Editora FIEL 2009.
Texto extraído do livro: Vencendo o Mundo – 1ª Edição, cap. 4 – Beeke, Joel. Editora Fiel, São José dos Campos, SP. 2009.
O leitor tem permissão para divulgar e distribuir esse texto, desde que não altere seu formato, conteúdo e / ou tradução e que informe os créditos tanto de autoria, como de tradução e copyright. Em caso de dúvidas, faça contato com a Editora Fiel.
Revisão: Tiago Santos
Copyright: © Editora FIEL 2009.
Texto extraído do livro: Vencendo o Mundo – 1ª Edição, cap. 4 – Beeke, Joel. Editora Fiel, São José dos Campos, SP. 2009.
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